Se você conheceu a Praia de Coqueiral, em Prado, no extremo sul do estado, há mais de dois anos – e, desde então, não retornou -, talvez se assuste com a paisagem hoje. O recepcionista Nark Cleyton, da pousada Ponta de Areia, uma das mais antigas da região, ainda custa a acreditar na mudança que aconteceu, diante dos olhos de quem passa e de quem vive por ali.
“Antes, tinha uma rua na frente da pousada e a praia era bem distante. Dois anos atrás, uma ressaca destruiu até o restaurante que a gente tinha. Agora, na maré cheia, o mar fica a três, quatro metros da piscina”, conta. A rua que ‘não está mais lá’ ajuda a dar uma noção da gravidade: a Praia do Coqueiral é um dos locais mais afetados pela erosão marítima em Prado, que decretou situação de emergência em junho.
Também no extremo sul do estado, a cidade de Mucuri decretou emergência devido à erosão em maio. Os dois municípios ilustram bem uma realidade presente em boa parte da costa baiana: em alguns locais, como a foz do Rio Jequitinhonha, em Belmonte, também no Sul, e do Rio Real, na divisa da Bahia e de Sergipe, a erosão levou a faixa de terra a diminuir até um quilômetro em dez anos.
Os dados fazem parte de um estudo inédito dos professores José Maria Landim Dominguez, Abilio Carlos da Silva Pinto Bittencourt e Junia Kacenelenbogen Guimarães, do Instituto de Geociências da Universidade Federal da Bahia (Ufba). A pesquisa será publicada no livro Panorama da Erosão Costeira no Brasil, do Ministério do Meio Ambiente e editado pelo professor Dieter Muehe, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). A Ufba é responsável pelo levantamento nos estados da Bahia, Sergipe, Alagoas e Paraíba e analisa os anos de 2006 e 2016.A rua sumiu
A rua que existia na frente da Pousada Ponta de Areia, em Prado, era a Avenida Beira Mar. Com seus quatro quilômetros de extensão, ela chamava atenção na costa do município – essa que, por sua vez, chega a 84 quilômetros.
“A Beira Mar deixou de existir totalmente há dois meses, quando lançamos o decreto”, conta o secretário de https://sigaanoticia.com.br/wp-content/uploads/2021/11/estudos-1.gifistração de Prado, Luiz Dupin. Hoje, a avenida só existe na memória dos moradores, visitantes e do Google Street View. No recurso do Google, as imagens panorâmicas da região são de 2012.
Nas fotos, é possível ver carros estacionados. Hoje, para chegar à Ponta de Areia de carro, a entrada teve que mudar. “Tivemos que abrir uma rua atrás porque o carro não tem como passar. A praia praticamente não existe mais. Quando os hóspedes chegam, se assustam. Falam: ‘nossa, não acredito’, lembrando de como era e como está hoje”.
Mas não para por aí. O resort La Isla, um dos maiores da região, fechou em 2015 devido à erosão, e segue em obras até hoje. Procurados pelo CORREIO, os representantes do empreendimento não se manifestaram. Em seu site, no entanto, uma mensagem anuncia as reformas no local. “Como o mar mudou, iremos acompanhar esse ciclo da natureza”, afirmam.
Prejuízo
Em Mucuri, o prejuízo recente foi de R$ 6,1 milhões, também de acordo com a Defesa Civil. Quatro ruas horizontais, paralelas à praia, sumiram. Outras cinco transversais também. Pelo estudo dos professores do Instituto de Geociências da Ufba, a erosão na costa chegou a reduzir 400 metros, entre 2006 e 2016.
O https://sigaanoticia.com.br/wp-content/uploads/2021/11/estudos-1.gifistrador da pousada Kambuká, Adilson Júnior, já não sabe o que fazer. Com a pousada em funcionamento há 30 anos, os custos para mantê-la de pé desde 2010 só aumentaram. Só com matéria-prima – incluindo as pedras para fazer uma contenção na frente do empreendimento – já gastou cerca de R$ 550 mil. Além disso, ele estima que a ocupação tenha caído em até 80%, em oito anos. “Fora uma parte da pousada que o mar levou. Eu perdi uns 600 m² de área livre da pousada, que tem quase 6 mil m² no total. Hoje, qualquer ressaca marítima que vem entra água na nossa piscina”.