A semana começou com um clima diferente para as 73 famílias do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) que agora integram o Assentamento José Martí, no município de Alcobaça, região Extremo Sul da Bahia. Na última sexta-feira, 22, os agricultores do local que se organizavam num esquema de acampamento receberam os lotes definitivos para a prática da agricultura familiar.
Agora assentados, eles estão em processo de transição para sair do modelo de produção coletiva do acampamento e investir em outros tipos de cultivo.
É o caso da agricultora Marlene Nunes Duarte Neves, 53, que já chegou a morar em casas de barro e lona e aguardava pelo lote há sete anos. A espera foi tanta que ela conta que chegou a adoecer de ansiedade nas vésperas do recebimento do terreno.
“Minha pressão chegou a subir de emoção porque é uma luta muito grande. É uma conquista, uma honra pra gente ter essa vitória que nós conseguimos. Eu estou muito feliz. Estou radiante”, vibra a agricultora, iluminando o olhar.
Para Marlene, o novo lote é promessa de vida e fartura: a plantação de mandioca e a criação de porcos e galinhas deverão se multiplicar, ao mesmo tempo em que a agricultora vai passar a cultivar também outros vegetais.
A diversificação da produção é uma característica da agricultura familiar, que se baseia no respeito à natureza, não utiliza venenos e faz frente ao modelo do agronegócio, pautado na monocultura e no uso de pesticidas.
“Vou continuar fazendo minha roça de mandioca e vou produzir alface, beterraba, cenoura. Quero produzir [também] batatinha, pra comer tudo da roça, pra não comer nada com inseticida. Não quero nada com veneno. Quero minhas coisas todas naturais. Pra mim, é uma honra muito grande”, projeta.
A área que agora passa a ser do Assentamento José Martí resulta de um processo de luta contra uma grande empresa de celulose que atuava na região por meio da monocultura do eucalipto. O empreendimento causou diversos prejuízos ambientais ao território, como desmatamento irregular, uso de agrotóxicos, morte de nascentes e córregos, além de danos às comunidades próximas.
A empresa tinha dívidas com a União e também ocupava parte do território de forma ilegal, utilizando, para a monocultura, terras devolutas – lotes públicos que, por serem bens do Estado, não podem ficar sob domínio privado.
Após nove anos de luta, num processo marcado por ocupações, despejos e ameaças, as 73 famílias obtiveram os tão esperados lotes.
“Pra nós, tem um sentido de realização de um sonho, que é você fazer toda uma luta e ver esse sonho se concretizar, que é cada família receber seu pedaço de terra”, comemora o coordenador do novo assentamento, José Mendes.
Ele sublinha que toda a produção do local será agroecológica, sistema baseado numa perspectiva de respeito ao ecossistema e sem adoção de venenos.