O Ministério Público Federal (MPF) ajuizou ação civil pública para assegurar proteção aos territórios e ao modo de vida dos povos originários e tradicionais do extremo sul da Bahia que há décadas são impactados pelo plantio de eucalipto na região. A medida cobra providências urgentes para conter o avanço irregular da atividade econômica e reparar os danos causados às comunidades quilombolas de Cândido Mariano, Helvécia, Volta Miúda, Mutum, Mota, Naiá, Vila Juazeiro e Rio do Sul, bem como às comunidades indígenas de Comexatibá e Barra Velha do Monte Pascoal.
A ação foi proposta contra a União, o Estado da Bahia, o Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema) e as empresas de celulose e papel Suzano e Veracel. Segundo o MPF, a expansão da eucaliptocultura vem ocorrendo com o fomento do poder público e a completa ausência de medidas de proteção socioambiental e cultural. A ação aponta ainda a omissão do Estado no cumprimento de tratados internacionais e de normas de caráter constitucional e legal que asseguram o direito dos povos tradicionais à consulta prévia, livre e informada sobre atividades, empreendimentos e decisões que os afetem.
Segundo o MPF, o monocultivo de eucaliptos gera degradação ambiental e afeta diretamente o modo de ser, viver e se relacionar das comunidades tradicionais. A atividade causa, entre outros problemas, escassez de água, improdutividade do solo, diminuição da biodiversidade e prejuízo à saúde da população, em razão da pulverização excessiva de veneno. A falta de oportunidades e a ampliação da pobreza obrigam as pessoas a deixarem a região para sobreviver. Nesse movimento, duas comunidades quilombolas já desapareceram – Naiá e Mutum – e outras estão ameaçadas de extinção.
A ação também destaca a inexistência de medidas para proteção e conservação de sítios arqueológicos identificados pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) nas comunidades quilombolas do extremo sul da Bahia. E afirma que o recuo mínimo das plantações de eucalipto de rios e nascentes, estradas, perímetros urbanos e das próprias comunidades indígenas e quilombolas não tem sido cumprido.
De acordo com o documento, a prática é encorajada por órgãos estatais como o Inema, que concede licenças às empresas sem exigir o cumprimento das exigências legais, especialmente a consulta prévia às populações afetadas. As indústrias de papel e celulose também contam com incentivos fiscais e apoio financeiro do poder público. Em 2004, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) repassou R$ 1,4 bilhão à Veracel para a implantação da fábrica em Eunápolis (BA). Já em 2006, a Suzano recebeu R$ 2,6 bilhões para a expansão da fábrica em Mucuri.
Além de apontar o descumprimento da legislação ambiental e a violação de direitos dos povos e comunidades tradicionais, a ação civil reúne elementos que indicam possível desrespeito às normas legais previstas para a ocupação de áreas por empresas estrangeiras. De acordo com as investigações, a Veracel Celulose, cujos acionistas são a empresa brasileira Suzano e a sueco-finlandesa Stora Enso, possui 293 propriedades na Bahia, totalizando mais de 200 mil hectares. De acordo com a lei, ela não poderia ocupar mais de 25% da área de um município, o que, segundo a ação, não ocorre em Eunápolis.